sábado, 31 de julho de 2010


De vez em quando caio na real e percebo que não sei nada da vida. Absolutamente NADA.


Cheguei à aula e de cara me irritei com a embalagem vazia de todynho que o Gustavo sempre coloca na cadeira, ele diz que é para guardar meu lugar. Já sugeri que ele coloque um caderno, mas ele insiste que a embalagem tem o mesmo efeito. Nesse dia ele percebeu e antes que eu fizesse, retirou a embalagem. Ficou me olhando por cima dos óculos e disse: “Lidi, a matéria da aula de hoje vai exigir muito da gente: concentração e paciência.” – Então eu vou embora. Soltei sem pensar duas vezes. Ele segurou no meu braço e falou com seriedade e firmeza: “Senta aí!”

Fiquei o primeiro tempo da aula inteiro tentando me concentrar com paciência, mas olhava para o Gustavo e lembrava com incomodo o modo como ele praticamente ordenou que eu me sentasse. Na hora do intervalo avisei que não ia descer por causa do frio, ele disse que traria suco de caju e saiu. Pensei em ir embora, mas fiquei. Acho que mais pelo suco de do que pela aula.

O Gustavo voltou logo, disse que não tinha suco na máquina de refresco e então trouxe de caixinha, porque não sabia qual outro sabor eu preferia. Aí comecei a falar que gostava também do de goiaba, maracujá, mas que não era muito fã das bebidas que tem guaraná... Ele me interrompeu e mais uma vez com seriedade e firmeza falou: “Lidiane, eu quero que você leia um pequeno texto que escrevi e me diga o que acha.”

Li o texto e só consegui dizer que era simplesmente inspirador, de uma maneira que eu gostaria que todos os seres humanos também pudessem ser um pouco.

Embora o que eu queria mesmo era falar que aquele trecho traduzia exatamente o que eu sentia, que transcrevia com fidelidade o que meu coração transbordava.

“Apenas pacifico o que resta de mim, adiante,
sabendo que tudo agrega, e conduz,
numa rede infinita de encontros e desencontros;
Não mais considero cinza ou tristeza
percebo nuances absolutamente novas
e, indescritíveis.

Ao passado: todo o meu amor -
e ao futuro: todo o meu amor também.” (Gustavo F.)

Mais uma lição de que NADA sei, nem mesmo descrever o que sinto, mas também de que a vida sempre traz quem te ensine. Peguei o caderno dele e tive a intenção de escrever ali, algo que pudesse ser inspirador como as palavras dele foram para mim. Queria expressar o quanto tinha sido importante ele me segurar com firmeza, ordenar que eu sentasse e permitir que lesse aquele texto. Mas estava (estou) esgotada, minha “bateria” já fraquinha pelo adiantado da hora e pelo esforço em ser paciente com a aula não me deixou retribuir a altura e transparecer criatividade suficiente. Limitei-me a transcrever uma pequena parte de um trecho do Pequeno Príncipe, que consegui me lembrar na hora:

“– Exatamente, disse a raposa. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a uns mil outros garotos. E tu não tens também necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti, única no mundo..."

O sorrisinho de canto e seu olhar por cima dos óculos denunciavam que ele havia gostado. Voltei para casa ainda sem saber NADA, mas mais do que nunca entendendo e tendo certeza de que...